O 2º dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) trouxe como tema de redação: “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”. Os estudantes tiveram 5h30 para produzir um texto dissertativo-argumentativo, além de responder 90 questões das provas de Linguagens e Matemática.
A palavra "combater" na escolha do INEP para formulação da questão levantou debates e dividiu opiniões. Haveria mesmo a necessidade de um tema como este, que envolve experiência pessoal e particularidades? Será mesmo se o Brasil, como Estado laico, é de fato intolerante no aspecto religioso?
Abaixo o blog destacou os comentários exprimidos em redes sociais pelos professores de Literatura e Língua Portuguesa, Hildalene Pinheiro - coordenadora da Revisão Pré-Enem (Seduc/Piauí) e Cláudio Rodrigues - conceituado professor poção-pedrense:
"É isso, vou
dar minha opinião sobre o tema da Redação ENEM 2016: "Caminhos para
combater a intolerância religiosa no Brasil”. Eu não sei em qual Brasil mora a
banca que elabora a prova do ENEM. Mas o Brasil em que eu moro é assim: existe
o PRECONCEITO, que agora ganhou nome de INTOLERÂNCIA, ao POBRE, ao NEGRO e aos
HOMOSSEXUAIS, SIM, COM CERTEZA HÁ. Agora INTOLERÂNCIA RELIGIOSA, é forçar a barra!
Talvez tenham querido dizer HIPOCRISIA RELIGIOSA que é bem diferente de
INTOLERÂNCIA! Queridos, o mesmo religioso que acende vela para Nossa Senhora
Aparecida de manhã, está à noite batendo tambor para o Pai de Ogum num terreiro
qualquer, ou está vidrado na Globo assistindo aquela novela de Reencarnação e
de Vidas passadas, ou ainda tem na entrada de casa uma mandala cabalística para
proteger o seu lar, ou ainda lê os livros da Zíbia Gasparetto, assiste aos
filmes das Mães de Chico Xavier, e por aí vai. Não é uma prática comum no
Brasil católicos apedrejarem evangélicos ou vice-versa. A madame beata que não
perde uma missa na manhã de domingo também não perde uma previsão dos astros no
aplicativo de horóscopo do seu smartphone, nem deixa de consultar a irmã
Janaína para fazer uma fezinha para o ex-marido deixar a novinha e voltar para
ela. A doidinha que não perde um baile funk se apaixona pelo filho do pastor da
igreja do bairro e no dia seguinte está convertida, arrependida de todos os
seus pecados. A gata sexy que posa nua nas capas das revistas masculinas lança
um livro biográfico rasgando todos os seus pecados e pregando o evangelho é
chamada de pastora. Aquele roqueiro adepto à vida alternativa do Raul Seixas, e
que gostava de puxar um baseado na rodinha de amigos, no final da carreira vira
pastor e lança um disco de música gospel. O BRASIL É ASSIM E ASSIM SERÁ. Então
onde mora essa INTOLERÂNCIA RELIGIOSA no nosso 8.516.000 km² de Brasil? Que já
tenha havido casos de conflitos e de atos antirreligiosos é verdade. Mas não a
ponto de exigir que 8 milhões de brasileiros escrevam textos apontando saídas
para resolver um problema tão ínfimo, diante de tantos outros problemas
caóticos do Brasil, como por exemplo, a falta de respeito com a CONSTITUIÇÃO, a
começar pela categoria cuja função é zelar pela mesma. Aí sim, teríamos
EXCELENTES PROPOSTAS, pois quem tem argumento crítico e ideias renovadoras é
sem dúvida a classe de estudantes do nosso vasto BRASIL. Pronto, falei."
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"Aproveitando-se do laicismo do estado, o INEP joga para bem
longe a possibilidade de questionamentos de temas que pudessem dar margem para
que os candidatos argumentassem algo sobre as já arranhadas situações política
e governamental brasileiras, sabendo que seria muita pretensão de minha parte
até mesmo cogitar que tais assuntos viessem cair. Não que o tema abordado não
seja importante, visto que é polêmico e incita os candidatos a refletirem sobre
como conviver com as diferenças, algo já muito discutido e ensinado nas
escolas. Porém, em se tratando de questões religiosas, percebe-se que é uma
questão de decisões pessoais e, quando muito, familiar seguir um ou outro
credo, especialmente quando se refere ao Brasil, que possivelmente venha a ser
um dos países de maior diversidade religiosa do mundo e nunca se viu falar em
guerra santa por aqui. Em tempos de seca, proliferação de epidemias, aumento da
violência, crise econômica, medidas impopulares, falar de assunto de cunho
religioso, quando se é laico, parece bem mais cômodo e configura uma tentativa
de "sair pela tangente." Muito provavelmente o termo governo e afins
não aparecerão nem mesmo nas propostas de intervenção da redação."